“Se a liberdade tem algum sentido, ela significa o direito de dizer ao povo o que ele não quer ouvir.” Futurista, George Orwell, em 1947, quando proferiu aquele pensamento retrataria partes da sociedade brasileira em 2014, constituída por segmentos que vivem como o macaquinho que não vê, não ouve e não fala. Nos últimos 20 anos, em razão da estabilização da economia, iniciada no governo Itamar Franco, com a domesticação da inflação, em decorrência do Plano Real, a vida melhorou para todos os brasileiros. As conquistas socioeconômicas proporcionaram a elevação da qualidade de vida de milhões de homens e mulheres nas periferias dos grandes aglomerados urbanos. Gerando socialmente, em função da renda, realidade positiva.
Infelizmente, nos últimos anos, o baixo crescimento econômico, o acúmulo de desajustes e maquiagens na política econômica, deteriorando os fundamentos macroeconômicos da estabilidade, colocam em risco as conquistas alcançadas. Alertado a tempo de corrigir as distorções, o governo Dilma Rousseff reage com a velha teoria conspiratória. Os críticos são “pessimistas e caras de pau”, opositores ao seu governo. O insuspeito ex-ministro Delfim Neto, consultor informal de Lula e Dilma, é objetivo: “Não há complô contra o governo. Há um complô de fatos que pode nos amolar muito.”
O “amolar muito” no futuro a que se refere, pode ser traduzido na estagnação econômica, com “pibinhos” recorrentes, e perda real de renda dos trabalhadores e assalariados. Chegaremos a 2015 numa conjuntura econômica adversa. As contas públicas, as contas externas, a inflação reprimida, que precisará ser repassada aos preços, integrarão o rol de desajustes que exigirão medidas duras e impopulares. O governo Rousseff não teve e não tem visão estratégica e disciplinadora do desenvolvimento. Optou por política econômica de curto prazo, estimuladora do consumismo garantidor da popularidade. Com relativo êxito no curto prazo. Adotou projeto de poder, ao invés de um projeto de País.
Ao invés de corrigir os desequilíbrios da economia brasileira, nos últimos três anos, optou pela política fiscal expansionista. Historicamente, as despesas primárias do governo tiveram relativo equilíbrio. Exemplo: em 1991 era de 14% do PIB (Produto Interno Bruto), em 2013 ficou acima de 23%. Significa que o governo federal gasta mais do que arrecada. A contenção das despesas crescentes, algumas de utilidade duvidosa, fatalmente ocorrerá em 2015 e o ajuste da economia será cruel e extravagante para a população brasileira. Em síntese: ao invés de política fiscal expansionista, a realidade imporá política fiscal contracionista.
Objetivamente, a conta a ser paga a partir de 2015 será pesada, gerando desemprego e substancial redução das rendas das famílias. Quem vier a assumir a presidência da República receberá uma verdadeira “herança maldita”. Houvesse o governo atual buscado o equilíbrio das contas públicas e efetuado o fundamental ajuste fiscal, colocando receitas e despesas em ordem, a situação seria diferente. Quem for vitorioso nas eleições de 2014 deve saber que a impopularidade baterá as portas já nos primeiros meses de governo.
Como enfrentar esse cenário adverso? Com liderança firme e visão de futuro, alertando para os desajustes desde a campanha eleitoral. Os candidatos de oposição, não podem tergiversar no debate desnudador dessa realidade produzida pela incompetência na administração das políticas públicas. Substituindo o marketing político das campanhas edulcoradas que só busca o voto, por uma estratégia diferenciada. Deveriam adotar o marketing público, aquele que se vincula à sociedade e pensa na cidadania. Autêntico “marketing da verdade”, para, em chegando ao poder, os brasileiros não se surpreenderem com as medidas econômicas e administrativas reformadoras das estruturas do Estado superdimensionadas. Exemplo: reduzir os atuais 39 ministérios para o máximo de 20. Recolocando o Brasil sintonizado com o seu futuro, onde desenvolvimento e justiça social constituem, fundamento inegociável, sob a égide do Estado de Direito democrático.
Hélio Duque é doutor em Ciências, área econômica, pela Universidade Estadual Paulista (Unesp). Foi Deputado Federal (1978-1991). É autor de vários livros sobre a economia brasileira e Suplente do Senador Alvaro Dias.